Quatro estações
Janeiro 04, 2022
Carlos Palmito

Inverno
De novo Bóreas saiu da sua caverna, trouxe com ele o Inverno.
Refugio-me numa cabana perdida algures na floresta da memória, sento-me junto à janela, ouvindo a madeira a crepitar enquanto é consumida pelas chamas, e apercebo-me da carência de sons, a ausência dos pássaros, das cigarras. A morte foi anunciada pelas geadas, guiada pelo sopro do norte.
Fecho os olhos, escuto os rugidos bravios do vento a passar no arvoredo, como um semideus em fúria, tombam as árvores e com elas um pedaço da minha alma.
Oiço a chuva a desabar dos céus ao som dos trovões… adormeço.

Primavera
E eis que Zéfiro surgiu então, vindo de oeste, é altura de renascimento, é o tempo de primavera.
Aqui as flores germinam, trasbordando sensualidade nos seus perfumes, os odores da floresta mutaram-se, cheira a musgo e a vida, os rios descongelaram libertando deles os aromas aprisionados pelo inverno.
A vida selvagem ressurgiu da sua hibernação, sinto as fragrâncias de pelos e penas, de relvas e árvores, sinto-te em mim, floresta minha amada.
Não posso deixar de sorrir, pois este é o cheiro da minha primavera, mesmo que refugiado na cabana, tudo é aroma, tudo é ressurreição.
As feridas foram saradas.

Verão
Mudam-se os ventos, mudam-se as estações, chegou do sul trazendo com ele o calor de uma noite de verão, seu nome é Noto.
E é nesta brisa que decido abandonar a cabana, surgiram calores extremos, sinto a pele a transpirar, a colar-se à parca roupa que consigo ter assente no corpo.
Aproximo-me do rio, e com as mãos em concha sorvo suas águas para me refrescar e hidratar.
Caminho lentamente em direção ao mar, as ervas são agora espinhos, e as terras transformaram-se em areia que sinto nos meus pés descalços.
Mergulho no oceano, sou neste instante água e sal.

Outono
Mal Noto se foi, surgiu de leste o ultimo dos irmãos, Euro, e com ele trouxe as cores do Outono.
As árvores pintaram-se de laranjas, vermelhos e roxos.
Despiram-se quase todas, excetuando as mais tímidas, colorando nesse ato as ruas da imaginação.
O azul do céu pigmentou-se em cinza e devastação, as nuvens tornaram-se uma rotina e o amarelo uma persistência.
Estou junto à cabana de madeira, comendo castanhas assadas e contemplando toda esta parafernália visual, o sol morre incendiando os céus, sei porque as nuvens se tornaram escarlate.
Abro a porta e entro, esta é a estação da solidão.
imagens retiradas da net no site mitologiagrega.net.br