Pétalas Rasgadas: Um Ballet de Vazio e Eternidade
Novembro 27, 2023
Carlos Palmito
Se te dessem uma rosa sem pétalas, o que verias?
Se te convidassem para as festas e romarias da aldeia, totalmente despidas de emoções e desejos, o que sentirias?
Imagina então a casa-de-banho, uma banheira a transbordar com uma água mais cristalina que a faca do açougueiro, escaldada por pedras incandescentes a tresandar a óleos afrodisíacos, e, no espelho embaciado, alguém tivesse escrito o teu nome. Qual seria o som narcisista que te tocaria o cérebro? Qual seria a textura das letras que formam aquilo que foi teu por um dia?
A que cheira o esgar de dor do amar?
A que sabe o sal que escorre do limão?
Quem era ela? A menina do timbalão?
Quem era ele? O menino do pardo ar?
Sabes, ontem sentei-me no banco de jardim. Era de pedra, como o coração dos Deuses no Olimpo.
Chovia uma neve miudinha em formato de coroas de espinhos, a cinza celestial de uma fornalha que não se extingue.
Adormeci, ali, ao som das harpas de um futuro desconhecido. Uma cobra emplumada sentou-se no meu ombro entoando hinos confusos de libertação, onde tu eras tanto a protagonista como a antagonista.
Conseguirás amar uma serpente?
Conseguirás amar um pesadelo?
Sabes, as estradas para a imortalidade são quase tão geladas quanto o vinho que o avô bebia ao jantar.
Pensei sentir saudades, mas apenas senti vazio. Será esse vácuo a minha interpretação fraudulenta do que é a melancolia?
Gostava de sentir algo, mas sinto somente um frio permanente.
Na pradaria, uma adolescente de cabelos loiros como o trigo arrancou as asas de todos os grilos, comeu-as, uma por uma, como se fossem cubos de açúcar numa valsa atemporal.
Ontem, a avó fez sopa.
E se te sussurrassem aos ouvidos as genealogias ascendentes de todas as pétalas brutalmente rasgadas da rosa existente no início do poema, onde as sepultarias?
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