Saltar para: Post [1], Comentários [2], Pesquisa e Arquivos [3]

Gritos mudos no silêncio das palavras!

Aqui toda a palavra grita em silêncio, sozinha na imensidão de todas as outras deixa-se ir... Adjetiva-me então

Os dias do fim

Maio 09, 2023

Carlos Palmito

Hazy_black_ink_texture_with_brushstrokes.jpg 

Duas sombras percorrem as pontes de madeira apodrentada pelas chuvadas ácidas,

na perpetuidade de um inverno glacial, que lhes queima a retina, a derme, a alma.

Que lhes delineia um sombreamento amarelado no esgar de uma insanidade; calma.

Digere-lhes as parcas gotículas de um assado de mutações genéticas, grotescamente flácidas.

 

As lágrimas misturam-se com as partículas da intempérie eternizada pelo pó.

Derretem alçapões de horrores e medos desconhecidos, liquefazem rochedos e acrofobias.

As vozes nas bolhas de gás que emanam dos olhares perdidos, tresandam a mijo e fobias.

Lá bem longe, um coelho trespassa a traqueia de um lobisomem, sem misericórdia nem dó.

 

Perto da terceira estrela negra, descem as escadarias helicoidais. O abismo geme,

a relva é um planalto de ossadas dos vindouros, dos fetos abortados no suicídio,

as flores são cerdas fumegantes de omnívoros carnudos, vítimas de homicídio,

as águas translucidamente opacas fedem a venenos camuflados num vento que treme.

 

— Que aconteceu ao mundo, pai? — pergunta o mais velho para o menos ancião.

— Aconteceu o homem. — Num outro extremo, as fábricas produzem fumo e desolação.

Um lodaçal de pigmentações brilhantemente pútridas, rodeia o lago que hidratou reis.

O seu toque significa morte, significa asfixiação, significa adeus. Duras são estas novas leis.

 

A árvore sagrada aguarda numa cadeira elétrica, rodeada por pus e excrementos.

De um falo ressequido, embalado a vácuo, onde as pombas brancas corroeram os filamentos

acéfalos da liberdade, da raiva e do ódio, até à distorção comportamental dos fundamentos,

escorre-lhe uma seiva translucida para os brotos mamários metamorfoseados de alimentos.

 

Cai o filho, tomba o pai, morre o espirito e o santo, a extrema unção é ofertada à humanidade,

o funeral da natureza é presenciado por mutações dismórficas de germes palacianos.

São compostas árias nas terras áridas de um deserto composto por cinzas, ao som de pianos.

Fecham-se as cortinas do planeta; uma por uma, todas as luzes se extinguiram na cidade.

 

No final dos anos, dos tempos, no inicio do vazio e da escuridão, em ti e em mim,

irmão de armas, irmão de sangue, irmão da resistência, irmão na morte,

sabemos que tudo se foi, desde os desertos do sul até às tundras do norte,

e no ar, como memória, como miragem, apenas um odor permaneceu… jasmim.

Mensagens

3 comentários

Comentar post

Mais sobre mim

foto do autor

Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

Arquivo

  1. 2024
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  1. 2023
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  1. 2022
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  1. 2021
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D