Gestos que perduram
Abril 03, 2023
Carlos Palmito
Somos um sopro, vidas curtas desfasadas da realidade.
Odiados, caídos, esquecidos, abandonados, desamparados,
solitários, numa multidão claustrofóbica, amargurados,
amedrontados, amputados, seres sem ideias e criatividade.
Somos folhas que se revoltam nos secos pântanos lunares,
rabiscos nas paredes e nas pontes, que tentam ser metáforas,
palavras que se repetem até aos limites da loucura, anáforas.
Ou talvez sejamos apenas uma gota de chuva num rio, no mar...
Somos a mão que cintila na escuridão de um olhar… despida,
nua, crua, minha, tua, o auxílio sem intento de recompensa,
somos quem nos reergue, eu a ti, tu a mim, somos a diferença,
o sorriso, o abrigo. Somos quem beija a lágrima da face humedecida.
Somos o abraço que nos cola os fragmentos da alma torturada,
a estimação e o desejo de nos presentearmos um novo dia,
tudo entre nós, apenas nós, sem reciprocidade nem fantasia,
somos a respiração desenfreada no toque, a pulsação acelerada.
Somos o gesto que inspira dor e expira uma alma a sangrar,
mas somos amados… entre nós, levantados, relembrados,
amparados, cimentados, fortificados, consolidados, colhidos e levados.
E quando nos entregamos, entregamos tudo, seja qual for o lugar!
Poema criado para um desafio que a bela Joana Pereira me colocou. Adoro desafios, especialmente estes que advêm de uma amizade e umlaço criado nas brumas do tempo.